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— “Que p**ra você quer?”, resmungou um homem sentado em um prédio caindo aos pedaços em Antígua, mal levantando os olhos da sua mesa entulhada.
— “Ahm… eu vim falar com o Bill Scott sobre uma vaga”, respondeu Paris, de 25 anos, sem graça, já traçando mentalmente sua rota de fuga daquela cena digna de um filme suspeito.
A carranca dele se transformou num sorriso travesso. “Então entra, querida, eu sou o Billy.”
Paris Smith, ex-CEO da Pinnacle, é amplamente reconhecida como uma das mulheres mais influentes no universo dos jogos online, tendo guiado as apostas esportivas por uma era de transformação ao longo de mais de três décadas. Nesta série em duas partes, Paris conta à SiGMA News como foram os dias crus, rebeldes e visionários do início da indústria do iGaming — e como era realmente fazer parte de uma equipe maluca de sonhadores e realizadores.
Era 1995. Recém-saída de uma bolsa no basquete universitário, Paris Smith se mudou para Antígua com um diploma em turismo. Mas, com a aparência típica de alguém do interior da Dakota do Norte em um país que priorizava a contratação de locais, arrumar um emprego estável num setor sazonal não estava sendo tão simples quanto ela imaginava.
Ela estava na correria, tentando descobrir o próximo passo, quando o destino cruzou seu caminho durante uma caminhada na praia com seu cachorro.
“Meu cachorro estava se afogando no mar, e um desconhecido correu, agarrou ele e o tirou da água”, lembra Paris. “A gente começou a conversar, aquele papo básico depois que alguém salva seu membro favorito da família. Ele me contou que tinha uma casa de apostas e conhecia um americano em Antígua, o Bill Scott, que estava procurando atendentes para o call center da World Wide Tele Sports.”
No dia seguinte, 7 de julho de 1995, ela apareceu para a entrevista.
“O prédio era fácil de encontrar — cheio de bitucas de cigarro, uma mesa coberta de cervejas, gravadores, telefones, uma TV e uns computadores bem trambolhudos.”
A entrevista com Bill Scott durou dez minutos — e o ‘treinamento’ oficial, talvez metade disso.
“Bill me disse: ‘Certo, quando alguém ligar, você fala ‘Sports pin?’. Digita o número PIN e dá o resumo da aposta.”
E eu: “O que é resumo?”
“Ele responde: ‘Parlays simples, parlays combinados, sweethearts ou reverses, você só precisa digitar STR para simples, SW para sweethearts, coloca o valor, repete para o cliente e diz ‘Confirmar?’, e é isso.”
Na hora, o telefone toca.
Paris atende: “Sports pin?”
Click. Desligaram.
Outra ligação: “Sports pin?”
Click.
“Descobri rapidinho que mulheres atendendo telefone para apostas esportivas era algo inédito na época”, diz ela. “Eles simplesmente desligavam na minha cara.”
Até que, enfim, alguém teve o bom senso de perguntar:
— “Aqui é a WWTS?”
— “Ahm, eu acho que sim”, responde Paris.
— “Aqui é o BW…”
Paris sorri: “Então é isso, a primeira ligação que atendi foi do Billy Walters, um dos apostadores profissionais mais famosos do mundo.”
Se isso não é um sinal do universo, não sei o que seria.
Algumas semanas se passaram, e o trabalho seguia tranquilo — era a calmaria antes da tempestade.
“Billy tinha colocado um anúncio de US$ 750 na revista do Jim Feist, e, de repente, os telefones não paravam de tocar.”
A WWTS não estava nem perto de estar preparada para esse tipo de volume. Eles cadastraram cerca de 1.500 novos jogadores com aquele anúncio — o que pode parecer pouco hoje, mas naquela época tudo era feito na mão. Nada de CRM, nenhum sistema automatizado de integração.
“Virou um caos — anotando nomes, endereços e telefones em pedaços de papel, explicando rapidamente como enviar dinheiro para apostar.”
“Na época, as únicas opções de pagamento eram Western Union Quick Collect, cheques administrativos ou transferências bancárias. Nada de Pix ou carteiras digitais. Era puro caos.”
Mas Paris não se desesperou — e não teve medo de se meter no meio da bagunça.
“E é assim que a gente começou. Resolvendo os problemas à medida que apareciam. E eles iam de ‘como receber esse dinheiro?’ para ‘espera, como é que a gente vai transformar isso numa empresa de verdade, Billy?’”
A WWTS cresceu num piscar de olhos — de meia dúzia de funcionários para 185 — e mesmo assim conseguiu manter a reputação de melhor atendimento ao cliente do setor.
Todas as atendentes eram mulheres — simpáticas, espertas, e trabalhando turnos longos o suficiente para conhecer os clientes regulares como se fossem amigos de bar.
“E aí, Johnny, já foi ver aquele joelho ruim no médico? Teu time joga sábado, viu? Me avisa se quiser mandar fundos pro fim de semana.”
Paris ri: “Esse era o nosso upsell em 1995.”
A confiança que construíram não vinha de ‘marketing’, pelo menos não no sentido de hoje. Era algo genuíno. “As pessoas não eram só vozes ao telefone — eram relações reais. E isso fazia toda a diferença.”
O papel de Paris cresceu naturalmente dentro da WWTS. Ela não recebia promoções formais — simplesmente se tornava indispensável. Ficou lá por 11 anos, não porque precisava, mas porque acreditava no que estavam construindo.
“Eu era leal ao Billy. Não queria abandonar o barco só porque outra empresa veio atrás.”
Mas vieram — especialmente a Pinnacle. Uma casa afiada, que estava ganhando notoriedade rápido, e os apostadores estavam começando a prestar atenção.
“Naquela época, não havia regulação, e os bancos complicavam tudo. Então a gente fazia transferências de uma casa para outra. E chegou um ponto em que 60% dos saques da WWTS iam direto para a Pinnacle.”
Paris começou a ir de mesa em mesa, pedindo para transferirem os clientes que estavam indo para a Pinnacle diretamente pra ela.
“Johnny, o que você tá fazendo? Por que tá mandando dinheiro pra Pinnacle?”
A resposta era sempre uma variação de:
“Ah, sei lá, todos os meus amigos apostam lá. Eles têm uma vantagem, a taxa deles é mais baixa.”
O boca a boca era fortíssimo. O crescimento da Pinnacle vinha de apostadores recomendando a outros apostadores onde estavam as melhores cotações. E o exército da Pinnacle estava só crescendo.
“Foi só em agosto de 2006, uns dois anos depois do Billy vender a WWTS, que me senti pronta para dar o salto e ir pra Pinnacle”, explica. “A hora parecia certa. Era hora de começar algo novo.”
Então, Paris se mudou para Curaçao — e para um novo tipo de caos.
“A Pinnacle não tinha estrutura. Nem cargos. Nenhum organograma. Era uma máquina pelada de fazer dinheiro que, olhando agora, precisava mesmo se preparar para o sucesso que estava por vir.”
Paris começou a contratar. Recorreu ao estilo WWTS, buscando pessoas que aguentassem pressão sem perder a cabeça. Cinco meses depois, recebeu uma ligação que mudaria tudo.
— “Oi Paris, então… como você é toda lógica e operacional, a gente quer sair do mercado dos EUA, e precisa que você cuide disso.”
Ela achou que fosse algo para o futuro, talvez depois do March Madness?
— “Não… no dia 11.”
— “De qual mês?”
— “Janeiro.”
Era dia 7.
O que veio a seguir foram quatro dias de pura execução. Paris elaborou o plano, quase não dormiu, e preparou a operação para desligar 35 mil contas ativas — todas com saldo — usando uma equipe de atendimento com apenas 12 pessoas.
“Era claramente impossível. Então trouxe outro Bill, um gênio que, em dois dias, escreveu e testou os scripts para automatizar tudo. À meia-noite do dia 11, .”
Na manhã seguinte, Paris acordou com centenas de mensagens, ligações, e-mails, chamadas no Skype e alertas no Facebook, todas perguntando a mesma coisa.
“Sim, a gente fez. Saímos do mercado dos EUA. E algumas semanas depois, sem a gente saber, os fundadores do Neteller foram presos — mas o dinheiro de todo mundo já tinha saído da Pinnacle.”
Apesar do peso daquele projeto (60 a 65% dos clientes da Pinnacle eram dos EUA), Paris considera essa uma das suas maiores conquistas.
“De tudo que fizemos, isso foi o que mais me orgulhou em termos de execução. Sair de um mercado inteiro, ver os lucros despencarem para 7 milhões por ano e depois reconstruir tudo do zero? Foi um baita desafio. Mas, quando saí da Pinnacle 17 anos depois, ela era tão grande quanto — ou até maior — do que quando entrei. A gente mandou muito bem.”
Em 2023, depois de décadas liderando a expansão da Pinnacle pela Europa e Ásia, Paris saiu da liderança executiva. Não para desacelerar, mas para começar a levantar a próxima geração.
Porque, quando se constrói um império a partir de uma praia em Antígua com nada além de uma caneta, um bloco de anotações e uma linha telefônica instável, sobra sabedoria pra passar adiante.
Siga com a parte dois da série OGs do iGaming, na próxima sexta-feira — com mais histórias nostálgicas dos anos 90 e a visão de Paris Smith para o futuro da indústria que ela ajudou a moldar.
Continue essa viagem no tempo na Parte Dois da nossa série Pioneiros do Jogo Online, onde Paris Smith compartilha mais histórias valiosas dos anos 90 e revela sua visão para o futuro do setor que ajudou a moldar.